quinta-feira, outubro 27, 2011

Mirosmar e Welson

Aproveitando essa onda de boatos sobre o fim da dupla, aproveito pra postar um texto meu publicado no Jornal do Commercio em 2008.

Talvez uma descrição superficial deles não impressione. São pequenos (ambos têm cerca de 1,60m de altura), usam roupas justas e botinhas de couro e carregam um sotaque forte do interior de Goiás. Mas mesmo destoando dos padrões do showbiz, Mirosmar e Welson são, inegavelmente, um sucesso. A dupla, que hoje atende pelo nome artístico de Zezé di Camargo e Luciano, consegue cativar sua platéia, seja numa apresentação musical ou numa entrevista coletiva, como a realizada na última quinta-feira, num hotel em Piedade, Jaboatão dos Guararapes. Na ocasião, a dupla conversou sobre o novo show, que tem sua última apresentação no Recife hoje, além de discutir os 16 anos de carreira e falar sobre política.

Sentados em poltronas forradas com um tecido imitando pele de onça, Zezé di Camargo e Luciano fazem pose de popstars para uma platéia de jornalistas que lota alvoroçada uma pequena sala do hotel. Tão pouco naturais quanto o material que cobre as cadeiras são algumas respostas às perguntas feitas pelos repórteres, que de tão repetidas soam como falas previamente ensaiadas. Indagados pela enésima vez sobre o governo Lula (eles aderiram à campanha de 2002, fazendo shows em comícios e gravando a música do programa eleitoral), dizem que têm algumas ressalvas, mas não se sentem arrependidos de terem dado o seu voto ao atual presidente.

“Se você analisar bem o governo Lula, verá que ele é infinitamente melhor do que o de Fernando Henrique Cardoso”, afirma Luciano. Entre os pontos de discordância com o presidente, a segunda voz da dupla reclama de programas assistencialistas do governo, como o Fome Zero. “Básico não é cesta de alimentação, isso é obrigação. Básico é poder ir ao cinema, ter informação com formação”, diz, quase numa citação involuntária à música Comida, dos Titãs.

“O artista não tem que ficar por trás da cortina. Ele tem de se revelar como cidadão”, diz Zezé. “Esse é o grande papel social do artista”, completa o músico, afirmando que procura manter-se sempre informado acompanhando a política nacional, “porque de nada adianta falar sem ter embasamento”. No último dia 16, os dois músicos participaram de um movimento contra a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) até 2011, questão defendida por Luís Inácio. Organizado pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), o evento reuniu cerca de 15 mil pessoas no Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo.

O movimento contra a CPMF não foi a única manifestação que ganhou o apoio da dupla. Zezé chegou a participar do Cansei, manifesto cívico criado pela empresariado e classe alta paulistanos criado após o acidente do avião da TAM em Guarulhos. Arrependido, Zezé diz que sua adesão foi precipitada. “Quando vi quem estava encabeçando o movimento, percebi que isso não ia a lugar algum”, diz se referindo ao empresário João Dória Jr., que ele classifica como “oportunista”. “Cansei do Cansei”, finaliza.

SHOW O discurso mais politizado parece ser uma mostra do amadurecimento pessoal de Zezé di Camargo e Luciano, evolução esta que eles também estão tentando levar para seu trabalho. Com o novo show, intitulado Duas horas de sucesso, os dois tentam quebrar parte do estigma de serem artistas românticos, fazendo incursões mais pops, com músicas como How can I go on, de Freddie Mercury e Hey Jude, dos Beatles.

E mesmo num tempo em que pouco ou nada se fala sobre duplas sertaneja – termo, aliás, bastante subjetivo - os dois afirmam que persistem no mercado fonográfico por conseguirem se reciclar. Em 16 anos de carreira, os irmãos já venderam mais de 24 milhões de álbuns, marca bastante significativa, ainda mais levando em consideração a frágil situação do mercado musical.

No Recife, a dupla faz alguns acréscimos no set list de 24 músicas prometido para as duas horas de show. “Aqui nós não temos fãs, mas legiões”, diz Zezé di Camargo e para homenagear esse público fiel, Feira de mangaio, de Sivuca e Vida de Viajante, de Luiz Gonzaga, fazem parte do repertório apenas na cidade. Já o encerramento do show deve ficar mesmo com o hit grudento É o amor, que levou a dupla a vender quase dois milhões de discos na sua estréia, em 1991.

SURPRESA Antes da coletiva acabar Zezé Di Camargo e Luciano receberam a inesperada visita de uma fã que ficou famosa recentemente. Rozinete Palmeira Serrão, de 51 anos, que deu luz aos próprios netos, já que sua filha tem o útero atrofiado e não poderia gestar filhos. Em companhia de Cláudia Michelle, a mãe biológica dos gêmeos recém-nascidos Antônio Bento e Victor Gabriel, a mãe-avó conheceu pessoalmente seus ídolos. Empolgada com o encontro, ela revelou que os bebês passaram os nove meses dentro da barriga dela ouvindo as canções dos dois irmãos. “Foi por isso que nasceu uma dupla. Se você escutasse J. Quest teria nascido um quinteto”, brincou Luciano.

segunda-feira, junho 27, 2011

Mercado de trabalho afetivo

Mesmo nos períodos em que desejo profundamente estar solteiro e me sinto contente com a situação, vez por outra bate uma sensação semelhante a estar desempregado.
Essa satisfação com o atual status funciona como uma espécie de seguro emprego ou indenização pós-demissão voluntária, mas por mais que ela esteja rendendo muito bem, você acaba sentindo alguma saudade do trabalho.

Não se trata de sentir falta do, digamos, antigo emprego. Afinal, mesmo que gostasse profundamente daquele ambiente de trabalho, há muito eu estava insatisfeito. Havia até pensado que talvez um período de férias fosse suficiente para espantar essa sensação, mas não. Era caso para se demitir mesmo.

E, então, fiquei solteiro novamente. E ainda que os trabalhos temporários no campo afetivo pareçam ser mais do que suficientes e trazendo um rendimento bem superior ao proporcionado pelo antigo emprego, alguma parte de mim fica pensando que uma hora terei de mandar currículos e prospectar uma nova vaga.

Mas, certamente, o melhor agora é mesmo me manter no mercado afetivo informal.

sexta-feira, junho 17, 2011

A escova de dentes

Sempre achei que a melhor representação do fim de um relacionamento é jogar fora a escova de dentes do até bem pouco tempo atrás ser amado. Enquanto a minha escova verde não estiver sozinha no pote do balcão do banheiro, continuo me sentindo, inevitavelmente, comprometido.

Aí encaro por alguns instantes aquela escova de dentes Aquafresh vermelha. Cerdas relativamente gastas implorando que eu faça uma analogia entre o seu estado e o desgaste da relação. Fujo desse pensamento rasteiro e concentro o olhar no objeto.

O tempo que gasto antes de arremessar a escova na lixeira não é de dúvida ou hesitação; estou muito convicto. É quase prazeroso o momento, ainda que melancólico.

Triunfante como Michael Jordan (não tenho nenhuma referência mais atual no basquete) fazendo uma cesta decisiva nos últimos momentos do jogo, acerto a escova na lixeira sem dificuldade. Vitória.

domingo, fevereiro 13, 2011

O que me levou a ser vegan

Mesmo o maior fã de rodízios de churrascaria acha absurdo e desumano alguém matar um cachorro. A minha mãe mesmo diz que ama animais, que humanos não valem nada e que quem não gosta de bicho merece morrer. Mas ela não consegue nem quer abdicar de comer aquele coração de galinha ou uma picanha. Se isso não for uma tremenda incoerência da maioria das pessoas, não sei mais o que pode ser.

Tornei-me vegetariano, acima de tudo, por questão de coerência. Gosto de animais e percebi que não faz sentido eu ter compaixão para com meus animais de estimação, me indignar com que usa casacos de pele ou ficar puto quando vejo alguém batendo num cavalo e, ao mesmo tempo, curtir um churrasco no final de semana. Sobretudo sabendo que a ingestão de carnes e derivados de animais não é algo indispensável para minha saúde e que existe um bocado de sofrimento até esses produtos chegarem ao meu prato.

Eu tento entender e respeitar quem diz que não é capaz de mudar sua dieta, mas não consigo aceitar que alguém me diga que não tem nada de errado no modo de produção desses alimentos. Utilizar pseudo-argumentos de cadeia alimentar é desculpa das mais esfarrapadas. Aliás, somente quando é conveniente nos colocamos no mesmo patamar de outros animais: se é um leão matando uma zebra bonitinha é porque ele é uma besta selvagem, mas se somos nós comendo vitelo, estamos apenas exercendo nosso papel superior na cadeia alimentar, a lei do mais forte etc.

Dizer que temos direito sobre outras criaturas ditas menos inteligentes abre brecha para inúmeros disparates. Posso subjugar pessoas de intelecto inferior ao meu? Posso bater num deficiente mental? E as crianças?

Alegar que animais não sofrem é outra mentira deslavada. Espero, sinceramente, que quem diz isso não acredite de verdade no que está falando. Vacas, porcos, galinhas, peixes e tantas outras criaturas das quais nos alimentamos são tão sensíveis à dor quanto nós. É falsa ingenuidade achar que eles não sofrem.

Se nada disso parece errado para quem consome carne e outros produtos de origem animal, é importante dizer também que:

- quase 30% de toda superfície do planeta é dedicada ao pasto do gado (estamos desmatando para isso, vide Amazônia);

- pelo menos 8% de toda água do mundo é destinada à irrigação de colheitas para alimentação de gado. São necessários de 20 a 30 mil litros de água para produzir um quilo de carne. Pra produzir um quilo de trigo, por exemplo, bastam apenas 150 litros de água.

- 1/3 de toda produção agrícola é para alimentar animais de corte. Ou seja, para aquele bife chegar na nossa mesa, foram consumidos centenas de quilos de alimentos. A quantidade de alimento que animal rende depois de morto é infinitamente menor do que a que ele consume.

Resumindo, a cadeia produtiva da carne demanda muito mais custos e energia do que alimentos de origem vegetal. E não vou nem falar do quanto é mais saudável uma dieta vegetariana.