Faz pouco tempo que comecei a sentir o tempo passar. Não sei se é cedo pra isso, mas agora, aos 23 anos, noto que estou envelhecendo. Longe de ser uma síndrome de Peter Pan (favor não insinuar nenhuma relação com o Michael Jackson), acho bem-vinda essa fase. Adulto.
Antes eu percebia apenas a queda de cabelo. Hoje vejo que tem outros sinais muito mais subjetivos, como a falta de deslumbramento com as coisas que me pareciam sensacionais tempos atrás. Falando assim parece que sou blasé ou vivido demais; nenhum dos dois. Apenas não me impressiono tanto. Complicadíssimo falar isso sem soar pedante. Ao menos descobri que não sou o único a pensar assim.
Ainda ontem encontrei meu grande companheiro de faculdade. Éramos Lennon/McCartney, hoje cada um em carreira solo e, ainda bem, nenhum dois foi baleado por um louco na frente do Dakota ou qualquer outro lugar. Assim como eu, ele também envelheceu.
When I’m sixty four
Entre um gole de uísque e outro, fomos lá passando nossas vidas, com a intimidade e cumplicidade que só dois velhos amigos poderiam ter e sem vergonha de usar esse clichê. Não temos mais aquela ânsia de fazer tudo, estar em todo lugar. Estamos sossegados com o que temos e com o que somos.
O nosso tipo de conversa hoje é diferente, embora os assuntos sejam praticamente os mesmos: comentários sobre Monty Python, de como O Poderoso Chefão nos fez mais homens, sobre como a adaptação de O Processo, de Kafka, feita pelo Orson Welles é sensacional etc.
De diferente, só mesmo o papo sobre as nossas respectivas, algo inédito entre nós; tá aí uma coisa nova que nos deslumbra. E claro que vieram os inevitáveis comentários sobre TPM das namoradas. Muita coisa mudou.
Estamos envelhecendo. Já era tempo.
domingo, agosto 17, 2008
Cauby e eu
Tem quem ache mal-gosto ou esquisitice o fato de eu adorar freqüentar eventos ruins. Não sei bem o motivo dessa minha inclinação por programas que são normalmente descartados pelas pessoas de bom senso. Como quase todo desvio de comportamento, isso deve ter raiz num trauma de infância não resolvido. Ao menos assim posso ter uma justificativa mais ou menos plausível e me isentar de qualquer responsabilidade. Sofri abuso, aos 11 anos de idade. Os molestadores: minha mãe e Cauby Peixoto.
Sim, a palavra abuso é apenas para causar dramaticidade. Mamãe não é nenhuma pervertida. Sobre o Cauby, me falta autoridade pra dizer qualquer coisa, mas obviamente não boto a mão fogo por ele nem por ninguém. Ah, também nunca fui molestado por qualquer pessoa, fique claro.
De qualquer maneira, o primeiro evento genuinamente ruim que presenciei na vida foi um show do Cauby Peixoto, uns 12 anos atrás, época já bem distante dos dias de glória dele. Fui na marra, dizia que não queria ver “aquela bicha velha que canta Conceição”. Mas minha mãe insistiu e me arrastou até lá, garantindo que eu iria gostar do show. Talvez por algum tipo intuição materna ela desconfiasse que no futuro eu seria um grande apreciador destes espetáculos de duvidosa qualidade.
Tendo esse histórico, é claro que eu não poderia perder a apresentação do Village People mês passado, cerca de três décadas depois de eles terem sido sucesso com dois únicos hits.
Impossível que possa ser bom algo envolvendo cantores-dançarinos de meia-idade tentando parecer sensuais vestindo roupas supostamente fetichistas. Por teimosia ou desconhecimento, algumas pessoas achavam que poderia ser uma boa balada e acabaram ficando frustradas após os shows do grupo no País. Eu, pelo contrário, fiquei mais do que satisfeito.
Estou convencido de que o Village People mostrou uma das piores apresentações que verei em
toda minha vida. Será muito difícil ver novamente aquela combinação única de pessoas esquisitas, música de péssima qualidade acompanhada de coreografia desconexa e falta de empolgação do público. Não tenho capacidade para imaginar algo mais constrangedor. Definiria o show como uma versão disco de fim de Baile dos Artistas reduzida a um universo de seis senhores no auge de sua decadência. Definitivamente ruim e, por isso mesmo, maravilhoso.
Embora de vertentes bem distintas, Cauby e Village têm em comum esse inegável ar de decadência, algo deprimente que me atrai. Mas não saberia explicar exatamente o que me faz
sair de casa e ir para festas meia-boca. Simplesmente me parece uma opção razoável e honesta de diversão. Mas não me limito a experiências musicais improváveis, o meu negócio é experimentar de tudo quanto for insólito e irrelevante.
Talvez tosco seja a palavra mais apropriada para definir alguns eventos, como um seminário holístico que participei certa vez. A reunião foi realizada por um grupo chamado Fraternidade Raio de Luz, que se definia como “uma fraternidade espiritual da Terra ligada aos seres divinos cósmicos confederativos (sic)”. Só pelos organizadores já parece irresistível, não? Difícil ficar indiferente. Tanto que saí de Boa Viagem, no Recife, e peguei dois ônibus numa manhã de domingo para chegar no local do encontro, no Centro de Igarassu. Não tinha nada melhor pra fazer naquele dia mesmo.
O seminário durou umas seis horas e propiciou momentos inesquecíveis: ouvi histórias sobre criaturas subterrâneas, anjos infiltrados entre homens e alienígenas querendo dominar o planeta. E ainda fui apresentado ao fundador do grupo, um cara que dizia ter adquirido poderes extra-sensoriais após receber instruções de seres extraterrestres. É o tipo de pessoa que eu jamais conheceria em qualquer outra ocasião. Portanto, os eventos ruins cumprem também um importante papel de socialização. Ponto positivo pra mim.
O grande problema destes eventos, e talvez seja o único, é que poucas vezes encontro alguém disposto a ir comigo. Nem os melhores amigos ou minha namorada costumam topar. Não quero tornar isso um prazer solitário, gosto de poder compartilhar com mais gente. Às vezes tenho de insistir muito para convencer, mas nunca desisto. Por falta de argumento, continuo usando chavão “vamos, vai ser divertido, prometo”. Eles dificilmente se divertem como eu. Aposto que o Cauby iria gostar de sair comigo. Da próxima vez vou chamá-lo, até mesmo como retribuição pelo show que ele me proporcionou. E vou convidar Conceição também, lógico.
Sim, a palavra abuso é apenas para causar dramaticidade. Mamãe não é nenhuma pervertida. Sobre o Cauby, me falta autoridade pra dizer qualquer coisa, mas obviamente não boto a mão fogo por ele nem por ninguém. Ah, também nunca fui molestado por qualquer pessoa, fique claro.
De qualquer maneira, o primeiro evento genuinamente ruim que presenciei na vida foi um show do Cauby Peixoto, uns 12 anos atrás, época já bem distante dos dias de glória dele. Fui na marra, dizia que não queria ver “aquela bicha velha que canta Conceição”. Mas minha mãe insistiu e me arrastou até lá, garantindo que eu iria gostar do show. Talvez por algum tipo intuição materna ela desconfiasse que no futuro eu seria um grande apreciador destes espetáculos de duvidosa qualidade.
Tendo esse histórico, é claro que eu não poderia perder a apresentação do Village People mês passado, cerca de três décadas depois de eles terem sido sucesso com dois únicos hits.
Impossível que possa ser bom algo envolvendo cantores-dançarinos de meia-idade tentando parecer sensuais vestindo roupas supostamente fetichistas. Por teimosia ou desconhecimento, algumas pessoas achavam que poderia ser uma boa balada e acabaram ficando frustradas após os shows do grupo no País. Eu, pelo contrário, fiquei mais do que satisfeito.
Estou convencido de que o Village People mostrou uma das piores apresentações que verei em
toda minha vida. Será muito difícil ver novamente aquela combinação única de pessoas esquisitas, música de péssima qualidade acompanhada de coreografia desconexa e falta de empolgação do público. Não tenho capacidade para imaginar algo mais constrangedor. Definiria o show como uma versão disco de fim de Baile dos Artistas reduzida a um universo de seis senhores no auge de sua decadência. Definitivamente ruim e, por isso mesmo, maravilhoso.
Embora de vertentes bem distintas, Cauby e Village têm em comum esse inegável ar de decadência, algo deprimente que me atrai. Mas não saberia explicar exatamente o que me faz
sair de casa e ir para festas meia-boca. Simplesmente me parece uma opção razoável e honesta de diversão. Mas não me limito a experiências musicais improváveis, o meu negócio é experimentar de tudo quanto for insólito e irrelevante.
Talvez tosco seja a palavra mais apropriada para definir alguns eventos, como um seminário holístico que participei certa vez. A reunião foi realizada por um grupo chamado Fraternidade Raio de Luz, que se definia como “uma fraternidade espiritual da Terra ligada aos seres divinos cósmicos confederativos (sic)”. Só pelos organizadores já parece irresistível, não? Difícil ficar indiferente. Tanto que saí de Boa Viagem, no Recife, e peguei dois ônibus numa manhã de domingo para chegar no local do encontro, no Centro de Igarassu. Não tinha nada melhor pra fazer naquele dia mesmo.
O seminário durou umas seis horas e propiciou momentos inesquecíveis: ouvi histórias sobre criaturas subterrâneas, anjos infiltrados entre homens e alienígenas querendo dominar o planeta. E ainda fui apresentado ao fundador do grupo, um cara que dizia ter adquirido poderes extra-sensoriais após receber instruções de seres extraterrestres. É o tipo de pessoa que eu jamais conheceria em qualquer outra ocasião. Portanto, os eventos ruins cumprem também um importante papel de socialização. Ponto positivo pra mim.
O grande problema destes eventos, e talvez seja o único, é que poucas vezes encontro alguém disposto a ir comigo. Nem os melhores amigos ou minha namorada costumam topar. Não quero tornar isso um prazer solitário, gosto de poder compartilhar com mais gente. Às vezes tenho de insistir muito para convencer, mas nunca desisto. Por falta de argumento, continuo usando chavão “vamos, vai ser divertido, prometo”. Eles dificilmente se divertem como eu. Aposto que o Cauby iria gostar de sair comigo. Da próxima vez vou chamá-lo, até mesmo como retribuição pelo show que ele me proporcionou. E vou convidar Conceição também, lógico.
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